Linha das Pombagiras na Umbanda

Raphael PH. Alves

7/23/20255 min ler

Laroyê, Pombagira! Pombagira é Mojubá!

Vamos trocar uma ideia séria e direta sobre uma das linhas mais mal compreendidas da Umbanda: as Pombagiras. Se você chegou até aqui, provavelmente já cansou de ouvir bobagem, besteira, e de ver essa força sendo associada a tudo o que não presta. Diabo, prostituição, maldade... tudo isso é reflexo de ignorância e preconceito. Quem realmente conhece Umbanda sabe que isso não tem nada a ver com a realidade espiritual dessa Linha de Trabalho.

O que você vai ler aqui é minha visão, com base no que vivo no terreiro, no que estudo e, principalmente, no respeito que carrego por essas entidades. Não é discurso bonito pra agradar ninguém, é papo de médium, de Umbandista, de quem vive isso de verdade. A ideia é simples: desmistificar, limpar o que está sujo e mostrar quem é de verdade a Pombagira, uma força de Lei, de poder, de cura, de liberdade.

Quem são as Pombagiras, afinal?

Pra começar: Pombagira não é uma entidade só. É um grau, uma linha de trabalho dentro da Umbanda, com várias falanges e formas de atuação. Assim como nem todo Caboclo foi índio, nem toda Pombagira foi prostituta. Essa é uma mentira enorme que precisa ser quebrada logo de cara.

O arquétipo da Pombagira nasce lá nas raízes africanas, com a Bombogira dos cultos de Angola, e foi ressignificado aqui no Brasil. Ela virou o símbolo da mulher livre. Quando associaram ela à "mulher da rua", ela não fugiu ela incorporou isso com dignidade e propósito. Não no sentido vulgar, mas como a mulher que é dona de si, do corpo dela, da vontade dela, sem se submeter a nada nem a ninguém.

Em uma sociedade que tenta o tempo todo reprimir o feminino, a sensualidade, o prazer, a Pombagira surge como uma revolução. Como disse Saraceni, ela é a explosão do feminino reprimido. Sua dança, sua gargalhada, sua franqueza, tudo isso é cura. Ela mostra as verdades que a gente tenta esconder, expõe hipocrisias e nos obriga a olhar pra dentro. E nisso, ela cura. Ela cura a vergonha, o medo, o recalque, a repressão. Ela cura o que a sociedade adoece, principalmente nas mulheres, mas que no fundo afeta a todos nós.

Pombagira e o Desejo

Se eu tivesse que resumir Pombagira numa palavra, seria: desejo. Mas não é só desejo sexual. É desejo de viver, de conquistar, de lutar, de realizar. Sem desejo, ninguém move um dedo. E é essa chama que ela reacende. Ela cuida da raiz da nossa vontade.

E entenda: uma Pombagira de Umbanda atua dentro da Lei Maior. Nada de fazer tudo por capricho. Ela sabe onde mexer, como e por quê. Atua conforme o merecimento e a necessidade espiritual da pessoa. Por isso é tão forte contra demandas. Muitas vezes, o que um "trabalho feito" atinge é a vontade da pessoa, ela para de querer viver, de lutar. E aí a Pombagira chega e sopra fogo de novo na alma. É assim que ela trabalha.

E o papo de amarração?

Vamos ser claros: Pombagira de Umbanda NÃO FAZ AMARRAÇÃO. Forçar a vontade de outra pessoa é violar a Lei Divina. Não tem desculpa. Quem diz que faz isso em nome de Pombagira ou está se enganando ou está sendo enganado. E quem trabalha com essa energia fora da Lei paga um preço espiritual alto, cedo ou tarde, a conta chega.

Agora, ela pode sim ajudar na autoestima, abrir caminhos no amor, curar traumas de relacionamentos, fortalecer o magnetismo pessoal. Mas sempre respeitando o livre-arbítrio e a Lei do Retorno.

A relação com Exu e a Linha da Esquerda

Pombagira e Exu são parceiros de trabalho. Não são opostos, são complementares. Exu é ação, é expansão. Pombagira é desejo, é atração. Um sem o outro não atua direito. E quando trabalham juntos, eles geram movimento com propósito.

Na Umbanda, a Esquerda não é "lado do mal". É linha de frente. É quem lida com o pesado, com a desordem, com o caos da vida prática. É limpeza, proteção, equilíbrio. E Pombagira é parte dessa força que encara o que muitos não têm coragem de enfrentar.

Falanges e especialidades

Pombagira é uma linha com muitas falanges, cada uma com seu campo de atuação. Os nomes que a gente ouve no terreiro – Maria Padilha, Sete Encruzilhadas, Rosa Caveira, Dama da Noite – não são nomes aleatórios. São códigos espirituais que indicam o tipo de energia com que aquela entidade trabalha.

Vou resumir algumas pra você entender:

  • Pombagiras das Almas – trabalham com o desapego, encerramento de ciclos, limpeza profunda. Ligadas a Omolu.

  • Pombagiras da Encruzilhada – abrem e fecham caminhos, trabalham escolhas. Ligadas a Exu.

  • Pombagiras da Mata – trabalham com ervas, cura, fartura. Ligadas a Oxóssi.

  • Pombagiras da Cachoeira – amor, fertilidade, prosperidade emocional. Ligadas a Oxum.

  • Pombagiras do Mar – questões familiares, maternidade, traumas profundos. Ligadas a Iemanjá.

  • Pombagiras do Fogo ou da Pedreira – justiça, transformações rápidas, defesa espiritual. Ligadas a Iansã e Xangô.

  • Pombagiras Ciganas – liberdade, alegria, prosperidade, vidência. Ligadas ao Povo do Oriente.

Quando uma Pombagira vem em terra, tudo nela tem função magística. O champanhe, o cigarro, o perfume, as flores, nada disso é vaidade. Tudo é ferramenta de trabalho.

  • O álcool limpa o campo etérico e afasta energia pesada.

  • A fumaça da cigarrilha atua como defumação, limpando larvas astrais.

  • Os perfumes e flores criam campos vibratórios específicos.

  • A gargalhada é um mantra, um som de poder que quebra negatividade e limpa o ambiente.

Como se conectar com respeito

Quer se aproximar da sua Pombagira? Comece pelo respeito. A saudação certa é: Laroyê, Pombagira! Pombagira é Mojubá!

Oferendar não é suborno espiritual. É uma troca, uma forma de criar conexão e dar os elementos que ela precisa pra atuar por você. Cada falange tem um ponto de força específico, e cada elemento usado tem um motivo magístico por trás.

Aqui vão alguns exemplos de elementos comuns nas oferendas:

  • Bebidas: Champanhe, licor, anis, vinho doce.

  • Fumo: Cigarrilhas boas, aromáticas.

  • Flores: Rosas vermelhas sem espinhos, cravos, palmas.

  • Frutas: Maçã, morango, uva rosada, figo, pêssego.

  • Velas: Vermelha, preta ou bicolor.

  • Comida: Farofa (padê) com dendê, mel, pimenta.

  • Adornos: Batom vermelho, leques, bijuterias, tecidos.

  • Locais: Encruzilhadas, cemitérios, jardins, rios, cachoeiras, praias, conforme a falange.

Pra fechar: Pombagira é força, é cura, é liberdade

Se você leu até aqui, espero que a imagem distorcida tenha ficado pra trás. Pombagira é Lei, é caminho, é poder espiritual do mais alto grau. Ela não aprisiona, ela liberta. Não destrói, ela transforma. Ela não é bagunça, é ordem dentro do caos.

Ter uma Pombagira com você é ter uma mentora forte, corajosa, justa e amorosa. Ela ensina a se amar, a se valorizar, a não se calar diante do mundo. E se você ouvir bem, ela vai te ensinar a viver com desejo, coragem e verdade.

Laroyê, minha Pombagira! Salve seu axé, salve sua força!

Bora Despertar.

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