Quem são os Marinheiros na Umbanda

Raphael PH. Alves

8/26/20255 min ler

Saravá, Povo do Mar! Salve a Marujada!

E aí, meu povo de axé. Hoje o papo é sobre aquele povo que chega no terreiro e já muda a energia. Aquele balanço que parece que vai derrubar o médium, aquela gargalhada solta, aquele jeito direto de falar que desarma a gente. Hoje a gente vai conversar sobre a Linha dos Marinheiros na Umbanda.

Vamos ser sinceros? Muita gente olha de fora e pensa: "ih, lá vem os bêbados". E eu te digo, meu irmão, minha irmã, que esse é um dos enganos mais tristes e superficiais que se pode cometer. Aquele balanço, aquele gingado, não tem nada a ver com cachaça. Aquilo é a mais pura manifestação da sabedoria do mar.

A parada é a seguinte: a vida da gente é como um oceano. Tem dia de marola mansa, de calmaria, mas tem dia de tempestade, de onda gigante que ameaça virar o nosso barco. E quem melhor pra nos ensinar a navegar nisso tudo do que aqueles que fizeram do mar a sua casa e do balanço das ondas o seu jeito de caminhar?

Então, se ajeita aí, firma o pensamento e vem comigo desvendar a profundidade, a alegria e a força de cura que existe na chegada da Marujada.

Quem é Esse Povo do Mar? A Força que Vem das Águas de Iemanjá

Primeiro de tudo, a gente precisa entender de onde vem essa força. A Linha dos Marinheiros é uma linha de trabalho que atua sob a irradiação da nossa grande Mãe, Iemanjá, a Rainha do Mar. São espíritos que, em suas últimas encarnações, tiveram suas vidas ligadas às águas: marinheiros, pescadores, navegadores, gente que conhecia os segredos, os perigos e a beleza do oceano como a palma da mão.

Eles chegam com o arquétipo do homem do mar: simples, direto, acostumado com a dureza da vida, mas com um coração enorme e uma alegria contagiante. Eles não têm a seriedade de um Caboclo ou a paciência de um Preto-Velho. A sabedoria deles é diferente. É a sabedoria da adaptação, do equilíbrio, de quem aprendeu a se manter de pé no chão que balança.

A grande missão dos Marinheiros é trabalhar o nosso equilíbrio emocional. O mar, na Umbanda, é o grande símbolo do nosso campo emocional, do nosso inconsciente. As tempestades de ansiedade, as marés de tristeza, as correntes de mágoa que nos puxam pra baixo... é nesse oceano particular que eles são mestres em navegar. Eles chegam para nos ensinar a não afundar nos nossos próprios problemas.

O Balanço que Cura: Entendendo o Trabalho dos Marinheiros

Vamos quebrar logo esse mito da bebida. O Marinheiro não está bêbado. Aquele balanço, aquele gingado, é a incorporação da energia do mar. É a forma que eles têm de trazer para o ambiente do terreiro a vibração das ondas. E isso tem uma função magística poderosíssima.

Esse movimento cria um vórtice, um redemoinho de energia. Quando um Marinheiro está "dançando" no terreiro, ele está, na verdade, puxando para si e descarregando as energias negativas, as larvas astrais, o "lixo" emocional que está impregnado no ambiente e nas pessoas. É uma limpeza energética profunda, feita com a força e o movimento das águas.

O trabalho deles é focado em algumas áreas principais:

  • Limpeza e Descarrego: Eles são especialistas em levar embora o que está pesado. Sabe aquela sensação de peso nas costas, de cansaço sem motivo? Os Marinheiros chegam e, com seu balanço, "lavam" a nossa aura, levando pro fundo do mar simbólico toda a negatividade.

  • Equilíbrio Emocional: Se você está passando por uma fase de instabilidade, de altos e baixos, de confusão mental, uma conversa com um Marinheiro pode ser um farol na escuridão. Eles nos ensinam a encontrar nosso centro, nosso ponto de equilíbrio, mesmo quando o mundo ao redor está um caos.

  • Abertura de Caminhos para o Novo: O marinheiro é, por natureza, um desbravador. Ele não tem medo de navegar para o desconhecido. A energia deles nos ajuda a sair do nosso "porto seguro" (que muitas vezes é a nossa zona de conforto cheia de problemas) e a ter coragem para buscar novos horizontes, novas oportunidades, uma vida nova.

No Chão do Terreiro: Símbolos, Bebidas e o Jeitão Deles

Quando a Marujada chega, a gira fica mais leve, mais solta. Eles são falantes, gostam de uma boa prosa, de dar conselhos diretos e, muitas vezes, de usar uma linguagem cheia de gírias e metáforas do mar.

Eles usam alguns elementos que são suas ferramentas de trabalho. E, de novo, é fundamental entender que não é vício, é ferramenta!

  • Bebidas (Rum, Cachaça, Vinho): Assim como o Exu usa o marafo, o Marinheiro usa sua bebida como um elemento desagregador de energias. O álcool, manipulado por eles no plano espiritual, tem o poder de quebrar e diluir as cargas energéticas mais densas. Eles não ficam "bêbados"; eles usam a energia da bebida para limpar.

  • Cigarro ou Cachimbo: A fumaça, para eles, é uma forma de defumação. Eles a usam para limpar o campo áurico das pessoas, soprando e direcionando a fumaça para onde a energia está mais "suja".

  • Símbolos: Muitos Marinheiros usam em suas guias ou em seus pontos riscados símbolos como a âncora (que representa a firmeza, o pé no chão, a necessidade de ter uma base sólida mesmo na instabilidade), o timão (que simboliza a necessidade de tomar a direção da própria vida) e as conchas (que guardam os segredos e os sons do mar).

A saudação para eles é um grito de alegria e respeito: "Salve a Marujada!".

A Família das Águas: Marinheiros, Sereias e o Povo do Mar

É importante saber que a Linha dos Marinheiros faz parte de um agrupamento maior, o Povo do Mar. Dentro dessa egrégora, não trabalham apenas os espíritos de homens que navegaram. Temos também outras manifestações maravilhosas da energia de Iemanjá.

Temos as Sereias e as Ondinas, que são espíritos encantados da natureza. O trabalho delas é mais sutil, muitas vezes através do canto, que funciona como um mantra que acalma e cura as dores mais profundas da alma.

E a força do mar é tão grande que ela se manifesta em todas as linhas. Até a nossa querida Linha da Esquerda tem seus especialistas no mar, como o Exu Pescador ou o Exu Jangada , mostrando como cada linha de trabalho na Umbanda tem seus agentes atuando dentro do reino sagrado de Iemanjá. Isso mostra a complexidade e a organização perfeita do plano espiritual.

No final das contas, a grande lição que os Marinheiros nos trazem é sobre a vida. A vida não é uma linha reta, não é terra firme e estável. A vida balança. A vida é imprevisível como o mar. E tá tudo bem.

Eles nos ensinam a não ter medo das ondas, a não nos desesperarmos na tempestade. Eles nos ensinam a "dançar conforme a música", a ter jogo de cintura, a encontrar o nosso equilíbrio no meio do caos.

A firmeza que eles nos trazem não é a firmeza da rocha, que é rígida. É a firmeza do marinheiro experiente, que sabe que, para se manter de pé no barco, ele precisa ser flexível, precisa acompanhar o balanço.

Que a gente possa aprender com a Marujada a segurar firme o timão da nossa vida, a ter fé como nossa âncora e a navegar pelas águas, às vezes turbulentas, das nossas emoções com mais alegria, coragem e sabedoria.

Que a bênção de Mãe Iemanjá e a alegria dos Marinheiros lavem nossos caminhos e nos mantenham sempre firmes e equilibrados na nossa jornada.

Salve a Marujada!