Orixá Oxalá: O Pai de Todos na Umbanda

Raphael PH. Alves

7/22/20259 min ler

E aí, meu povo de fé! Bora trocar uma ideia reta e limpa sobre o nosso Pai Maior? Vamos falar de Oxalá. Mas ó, esquece aquele papo complicado, cheio de palavra difícil que mais parece que a gente tá lendo bula de remédio. A proposta aqui é outra. É falar de Orixá do jeito que a gente sente, do jeito que a gente vive no terreiro e, principalmente, na vida. É pra ser eu e você, conversando de igual pra igual, só que sem erro de português, beleza?

Quando a gente fala de Oxalá, não estamos falando de uma estátua no congá ou de uma figura distante lá no céu. Estamos falando daquela paz que a gente busca no meio do caos do dia a dia, daquela clareza que surge depois da tempestade, da fé que faz a gente levantar da cama mesmo quando tudo parece dar errado. Entender Oxalá é, no fundo, entender a base da nossa Umbanda. Ele é o pilar que sustenta a nossa fé, a energia que acalma e congrega tudo e todos.

A verdade é que a Umbanda está passando por uma transformação. Estamos deixando para trás a necessidade de nos escondermos atrás de outras religiões ou de usar códigos que só os "iniciados" entendem. A nossa religião está encontrando a sua própria voz, uma voz mais direta, mais honesta. E essa conversa que vamos ter aqui reflete exatamente isso. É a busca por uma teologia acessível, que faça sentido no coração antes de fazer na cabeça. Autores importantes da nossa religião já vêm batendo nessa tecla: precisamos entender os Orixás em sua grandeza, como poderes divinos que estão em nós, e não como "santos" que só atendem se a gente pagar um pedágio com uma oferenda. Então, se a gente quer ser uma Umbanda com fundamento de verdade, precisamos falar a nossa língua, de um jeito que todo filho de fé entenda e se sinta parte. E é isso que vamos fazer agora.

Quem é Oxalá o Orixá da Fé e da Paz

Vamos direto ao ponto: quem é Oxalá? Se a gente tivesse que resumir em uma palavra, essa palavra seria . Mas não uma fé cega. É a fé em Olorum, o nosso Deus único, o Criador de tudo e de todos. Na Umbanda, a gente não é politeísta, e é bom deixar isso bem claro pra acabar com qualquer papo furado. Nós acreditamos em um único Deus, que pode ser chamado de Olorum, Zambi, Tupã, o nome muda, mas a Força é a mesma.

Então, onde os Orixás entram nessa história? Eles não são "deuses menores". Pensa assim: se Olorum é a usina de energia, os Orixás são as diferentes manifestações dessa energia. Oxalá é a manifestação da Fé, da Paz, da Pureza. Ele é o próprio sentimento religioso que brota na gente. Ogum é a manifestação da Lei, da Ordem. Iemanjá é a manifestação da Geração, do amparo maternal. Cada Orixá é um poder, um mistério, uma faceta do Divino Criador. É a mesma lógica de outras religiões monoteístas, como o Cristianismo, que tem Deus e sua corte de Anjos e Arcanjos. Na Umbanda, temos Olorum e Suas divindades-mistério, os Orixás. Essa compreensão é mais do que um detalhe teológico; é uma afirmação da nossa identidade e da complexidade da nossa fé, nos colocando em pé de igualdade com qualquer outra grande religião e combatendo o preconceito que historicamente nos rotulou de forma pejorativa.

O Sincretismo com Jesus Cristo

E a associação com Jesus Cristo? Muita gente confunde e acha que Oxalá é Jesus. Não é bem assim. O sincretismo foi, antes de tudo, uma estratégia de sobrevivência dos nossos irmãos escravizados. Proibidos de cultuar suas divindades, eles associavam seus Orixás aos santos católicos para poderem manter sua fé viva. Era uma forma de "traduzir" seus sagrados para a linguagem do opressor.

Hoje, entendemos essa associação de uma forma mais profunda, como uma correspondência de arquétipos. Tanto Oxalá quanto Jesus representam o amor incondicional, a paz, o sacrifício em prol do coletivo, a fé que remove montanhas e a capacidade de perdoar. Eles vibram na mesma sintonia de amor e pureza. Então, quando vemos uma imagem de Jesus no nosso congá, estamos reverenciando essa vibração, esse poder, que na nossa Umbanda chamamos de Oxalá.

Os Atributos do Pai Maior

Oxalá é a própria energia da criação em seu estado mais puro. Ele representa:

  • A Fé: A confiança inabalável no poder divino e no caminho da evolução.

  • A Paz: A calma interior, a serenidade que aquieta a mente e o coração.

  • A Harmonia: O equilíbrio entre todas as forças, a capacidade de conviver com as diferenças.

  • A Esperança: A certeza de que, mesmo nas maiores dificuldades, um novo dia virá.

  • A Resignação: A aceitação sábia daquilo que não podemos mudar.

  • A Confiança: A entrega ao plano divino, sabendo que somos amparados.

  • O Perdão: A capacidade de liberar as mágoas e seguir em frente, limpando a alma.

  • A Pureza: A busca pela limpeza dos pensamentos, sentimentos e ações.

  • O Amparo Religioso: O colo que acolhe todos os filhos de fé, sem distinção.

Ele é o Orixá que gestou a humanidade, que nos moldou a partir do barro primordial, segundo as lendas. Por isso, ele é o Pai de todos, o início de tudo, a luz branca que contém todas as outras cores.

A Energia de Oxalá

Uma das maiores armadilhas que a gente pode cair é achar que Orixá é uma entidade que mora longe e que só nos ouve se fizermos um ritual complicado ou uma oferenda cara. Isso é limitar o sagrado, é colocar preço na fé, é o famoso "toma lá, dá cá" que não tem nada a ver com a verdadeira Umbanda. A beleza de Pai Oxalá é que Ele é onipresente. Ele está em todo lugar, o tempo todo, e principalmente, dentro de nós.

A verdadeira presença de Oxalá não está na cachoeira ou na pedreira. Está no seu coração quando você decide perdoar quem te feriu. Está na sua mente quando, no meio do desespero, uma fagulha de esperança se acende. Está na sua atitude quando você escolhe a paz em vez da briga. A Umbanda, em sua essência, nos ensina que o sagrado é uma experiência interna. A luz de Oxalá não é um holofote que vem de fora para nos iluminar; é uma chama que "brota no nosso íntimo e é irradiada por meio do nosso espírito". Quando sentimos essa energia, as mazelas do dia a dia perdem força, os problemas parecem menores, porque a gente se reconecta com a nossa força interior, com a nossa fé.

Essa democratização do sagrado é uma correção teológica poderosa. Ela tira o poder do ritual externo e o devolve para o fiel, para a sua fé. Não quer dizer que os rituais não sejam importantes – eles são, e vamos falar disso. Mas significa que o canal principal de comunicação com o divino é a sua intenção, sua oração, seu sentimento. Como diz Rubens Saraceni, "basta ajoelharmos, orarmos e clamar pelo seu auxílio que ele começa a nos ajudar no mesmo instante, não importando onde nos encontremos e em que condições". Isso é empoderador. A religião se torna uma ferramenta para despertar a divindade que já mora em nós.

  • Regência: Fé, Paz, Pureza, Harmonia

  • Sincretismo: Jesus Cristo

  • Cor: Branco

  • Dia da Semana: Domingo

  • Ponto de Força: Campos Abertos

  • Elemento:Éter / Espaço

  • Saudação: Epa Babá Oxalá!

  • Oferendas: Canjica, frutas brancas, coco verde, flores brancas

  • Proibições:Álcool, dendê, sal em excesso, elementos de origem animal

Sintonizando com a Vibração de Oxalá

Para se conectar com essa energia, não precisa de mágica. É um exercício de sintonia, de direcionar a sua atenção e o seu sentimento.

  • Use o Branco: Vestir branco, principalmente aos domingos, ajuda a sintonizar com a vibração de pureza e paz de Oxalá. A cor é uma energia, e o branco reflete todas as outras, trazendo equilíbrio.

  • Acenda uma Vela Branca: A vela é um ponto de luz, um portal. Ao acender uma vela branca para Oxalá, com fé e intenção, você está criando um foco de conexão com a vibração dele.

  • Faça suas Preces: Converse com ele. Ajoelhe-se, se sentir vontade, e abra seu coração. Peça paz, clareza, força para perdoar. A oração sincera é o telefone direto para o sagrado.

  • Saudação: Use sua saudação, "Epa Babá Oxalá!", que é um cumprimento de profundo respeito ao Pai. Fale em voz alta, sinta a vibração da palavra.

  • Visite seus Pontos de Força: Ir a um campo aberto, um lugar tranquilo na natureza, e simplesmente respirar, sentir o sol, o vento, é uma forma poderosa de se conectar com a energia dele.

Oferendas para Oxalá

Vamos falar de um assunto que gera muita dúvida: oferenda. Primeiro, vamos tirar da cabeça a ideia de que oferenda é "pagamento" ou "compra de favor". Não é. Uma oferenda é um presente, um ato de amor, uma forma de materializar a nossa fé e o nosso agradecimento. É também um ato de magia, onde usamos elementos da natureza para criar um ponto de força, um campo magnético que nos alinha com a vibração do Orixá que queremos saudar ou pedir auxílio.

Para Oxalá, a oferenda é um reflexo direto de sua própria natureza: tudo é branco, puro e calmo.

O que Oferendar para Oxalá

Aqui está uma lista simples e direta dos elementos que agradam nosso Pai Maior. Lembre-se, o mais importante é a sua fé e o carinho ao preparar.

  • Velas: Sempre brancas.

  • Comida: A principal é a canjica branca (mungunzá). Cozinhe o milho branco apenas com água. Depois de cozido, pode regar com um pouco de mel, se quiser, mas nunca coloque sal. Sirva em uma tigela de louça branca.

  • Frutas: Dê preferência às frutas brancas ou de polpa clara, como maçã, pera, uva branca, melão, fruta do conde.

  • Bebida: A única bebida para Oxalá é água pura, de preferência de uma fonte ou mineral. Água de coco também é muito bem-vinda.

  • Flores: Flores brancas, como rosas, lírios, palmas brancas ou crisântemos brancos.

Onde Entregar a Oferenda

O ponto de força de Oxalá na natureza são os campos abertos, lugares altos e limpos. Pode ser o topo de uma colina, um campo verdejante, um lugar que transmita paz. Ao entregar, forre o chão com um pano branco (morim), arrume os elementos com carinho, acenda suas velas e faça sua oração. E uma dica de umbandista consciente: a natureza é sagrada. Depois que as velas queimarem, volte ao local e recolha todo o lixo (garrafas, potes, plásticos). A comida e as flores podem ficar, pois a natureza se encarrega delas. Respeitar o campo sagrado do Orixá é parte fundamental da oferenda.

Oxalá e as Sete Linhas

Para entender a organização da Umbanda, a gente precisa falar das Sete Linhas. Pensa assim: se Olorum fosse o grande CEO do Universo, as Sete Linhas seriam as sete diretorias principais da empresa divina. Cada linha é uma vibração primordial de Deus, um "departamento" que cuida de um aspecto fundamental da vida e da evolução. Temos a Linha do Amor, a da Lei, a da Justiça, e assim por diante.

E Oxalá? Ele é o "diretor" da primeira e mais fundamental de todas: a Primeira Linha, a Linha da Fé. Também chamada de Linha Cristalina, é a vibração que irradia a fé, a religiosidade e a confiança que dão base para todas as outras. Sem a fé de Oxalá, os outros pilares não se sustentam. Ele é o começo de tudo, a base sobre a qual toda a estrutura divina é construída.

O Equilíbrio Divino: Oxalá e seu Par, Oiá-Logunan (O Tempo)

Na teologia da Umbanda Sagrada, nada é estático ou absoluto. Tudo funciona em um sistema de equilíbrio dinâmico, baseado em polaridades. Cada Linha de Umbanda é regida por um par de Orixás, um de polo masculino/passivo/universal e outro de polo feminino/ativo/cósmico.

Na Linha da Fé, o par de Oxalá é a Orixá Oiá-Logunan, também conhecida como o próprio Tempo.

  • Oxalá representa o polo passivo, universal. Ele é a fé que congrega, que atrai, que une os seres em torno do sagrado. Sua energia é centrípeta, puxando para o centro, para a paz.

  • Oiá-Logunan (Tempo) representa o polo ativo, cósmico. Ela é a fé em movimento, a ordenadora. Enquanto Oxalá congrega, o Tempo ordena, corrige os desvios, acelera ou paralisa os caminhos para que a Lei da Fé seja cumprida.

Essa estrutura mostra a sabedoria da criação. A fé não é uma crença parada, cega. Ela é constantemente testada, ordenada e guiada pela ação do Tempo. É um sistema de pesos e contrapesos que garante o equilíbrio e a evolução. A paz de Oxalá é equilibrada pela ação ordenadora de Oiá-Logunan. Essa dualidade existe em todas as Sete Linhas, mostrando que o universo da Umbanda é um sistema complexo, interdependente e em constante movimento.

Chegamos ao fim da nossa conversa, mas o aprendizado sobre Pai Oxalá nunca termina. Se a gente pudesse resumir tudo em uma única ideia, seria esta: Oxalá não é uma entidade para ser apenas cultuada no terreiro aos domingos. Ele é uma energia viva, uma vibração de paz, amor e fé que está disponível para todos nós, a todo momento. Ele é a manifestação da Fé do nosso Pai Olorum, a luz que brota de dentro e nos dá força para seguir em frente.

A maior oferenda que podemos fazer a ele não é a canjica mais bonita, mas sim a prática diária de suas virtudes. É ter a paciência de Oxalá no trânsito caótico, a capacidade de perdão dele quando alguém nos magoa, a esperança dele quando tudo parece perdido. A verdadeira Umbanda, aquela que transforma, é a que a gente pratica nas nossas atitudes, na nossa "reforma íntima".

Que esta troca de ideias tenha clareado seu caminho e fortalecido sua fé. Que a paz de nosso Pai Maior inunde seu coração, sua mente e sua vida, hoje e sempre. Leve essa energia com você, para o seu trabalho, para a sua família, para as suas batalhas diárias. E sempre que precisar de amparo, de um colo espiritual, lembre-se de fechar os olhos, respirar fundo e chamar por ele.

Epa Babá, Oxalá!

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